Por:Julio Machado
Podcast
ago 2016
Gostaria de comentar um episódio que me impressionou muito quando entrei em contato pela primeira vez com o filme “Os miseráveis”, baseado no romance do escritor francês Victor Hugo, publicado em meados do século 19. Sempre que posso falo sobre ele nos meus cursos e palestras quando quero dar algum exemplo de perdão e de superação humana.
Esta obra conta a história de Jean Valjean que ainda jovem rouba um pão para matar sua fome. Ele é preso e condenado a realizar trabalhos forçados. Recebe sua liberdade condicional após 19 anos de prisão e começa a perambular de um lugar para outro. Como não consegue nenhum tipo de emprego, por causa da sua condição de condenado, continua então roubando para sobreviver.
Um dia ele chega à casa paroquial de um vilarejo e pede pousada ao bispo, que o recebe como hóspede, providencia uma cama limpa, comida e pergunta por quanto tempo ele ainda permaneceria por ali. Ele responde que seguiria viagem no dia seguinte e o sacerdote ainda pede à empregada que depois preparasse uma merenda para ele seguir o seu caminho. Enquanto faz a sua refeição Jean Valjean diz que depois daquele prato de comida e de uma boa noite de sono ele seria um novo homem.
No meio da noite ele acorda tomado por pesadelos e resolve ir embora ainda de madrugada, mas antes vai até o refeitório e furta todas as peças de prata do faqueiro. Com os estranhos barulhos o bispo também acorda e se levanta ainda a tempo de vê-lo embolsando as peças. Daí recebe uma pancada na cabeça e cai desmaiado.
Por volta do meio dia, Valjean é trazido até a igreja por alguns policiais que o viram em uma das aldeias próximas tentando vender uma prataria suspeita. Como se tratava de peças com o brasão do bispo, os policiais logo imaginaram que elas poderiam ter sido furtadas da igreja. Esperavam que o bispo o reconhecesse e que desse a queixa de roubo contra aquele homem.
Agora vem a surpresa maior: o sacerdote nega que ele teria roubado as peças dizendo que ele mesmo as teria dado àquele bom homem para que ele as vendesse e recomeçasse a sua vida com algum dinheiro. Os policiais, boquiabertos e constrangidos de terem suspeitado do moço de aparência duvidosa, dizem: “Então o senhor não vai acusá-lo?”
– Não, diz o padre. Ele não é ladrão. Ele não roubou nada. É um homem honesto, e ainda ontem me disse que a partir de agora seria uma nova pessoa. Os policiais ficaram na maior saia justa, pediram desculpas e foram embora.
O sacerdote e o condenado ficam agora cara-a-cara. Valjean estava todo desconcertado e sem entender nada, pois até esse momento de sua vida ninguém o tinha tratado dessa maneira. Até então ele só era visto pela sociedade como um ladrão irrecuperável. O bispo olhou para ele e sorrindo lhe cobrou mais uma vez a sua promessa de que ele seria, a partir de agora, um novo homem. E ainda lhe falou na saída: com essa prata eu comprei a sua alma para Deus.
Esta demonstração de perdão e de bondade fez Jean Valjean voltar a crer nas pessoas. Ele se tornou um homem de bem. Passou a ser um benfeitor na cidade onde se estabeleceu. Tornou-se também um empresário bem sucedido, prefeito da cidade e uma pessoa reconhecida por todos pela sua generosidade. Um dos episódios mais marcantes do filme é quando ele se torna o pai adotivo da filha de uma prostituta, de quem ele cuidou até o último suspiro no seu leito de morte.
Aqui temos um exemplo extremo e até bem difícil de ser seguido, mostrando como uma pessoa pode ser recuperada quando encontra alguém que não a vê pelas aparências, que não a julga e consegue ver, além da dura capa que a encobre, o Filho de Deus que ela é.