Por:Julio Machado
Podcast
maio 2017
CLIQUE NO PLAY PARA OUVIR
Vamos abordar hoje a questão do ciúme. Quero demonstrar como ele pode ajudar na construção do relacionamento e, também, em que situação ele pode colocar tudo a perder.
Por mais paradoxal que pareça, um dos ingredientes que mais assegura o vínculo de um casal é a liberdade. Dizendo de um modo mais enfático: o que nos cativa… é a liberdade.
Por meio dela a relação pode respirar e percorrer caminhos criativos e construtivos. Neste caso, o outro me cativa não é quando ele me prende, mas sim quando eu me prendo a ele, espontaneamente.
Ao contrário, uma união que é fechada como numa gaiola dourada, os parceiros tendem a agir como se fossem donos um do outro. Sentem-se ameaçados com qualquer novo empreendimento que o outro venha a fazer sozinho, seja um curso, uma viagem, uma terapia, etc. Como isso pode lhes fugir ao controle, temem que essa escapada possa ameaçar a manutenção do relacionamento.
O ciúme é como uma moeda – tem duas faces. Dependendo de qual dos lados experimentamos, o seu efeito pode ser destrutivo ou mais saudável.
O modo mais comum de nos comportarmos quando somos atacados pelo ciúme é lançarmos em contra-ataque, nossas flechas contra o outro. Ficamos emburrados, agressivos e chantagistas; isto para mostrar ao outro como ele nos magoou com a sua maneira de ser ou de agir. Essa é a face perversa e destrutiva do ciúme, pois também queremos que o outro sofra pela culpa de nos fazer sofrer. Tentando mascarar o ciúme como uma prova de amor, na verdade ficamos é desassossegados e ansiosos por medo de perder a posse do outro.
Me ocorre aqui aquela situação de um casal de namorados onde ela viajou com a sua turma de faculdade para uma excursão na praia. Enquanto se despedia do namorado ele a fez jurar que ela telefonaria todos os dias, a pretexto de matar um pouco a saudade. Pois no primeiro telefonema, no dia seguinte, quando ele pergunta como ela está se sentindo, qual é a resposta que ele espera receber? O quê você acha que uma pessoa possessiva gostaria de ouvir do outro lado da linha?
1ª opção: Estou ótima, a turma é super divertida, o lugar muito agradável e esta noite ficamos até de madrugada tocando violão na praia.
2ª opção: Estou deprimida, só tem gente chata neste lugar, aqui está tudo cinza sem você e estou louca para voltar para casa.
E aí, ainda tem alguma dúvida do que o ciumento quer escutar?
Pois acertou quem respondeu a 2ª opção. No fundo, no fundo o que uma pessoa ciumenta mais deseja não é o bem e a felicidade da pessoa amada, a não ser que esteja na sua companhia. Longe da sua presença, quanto pior ela estiver, melhor, pois assim ela comprova, através do fracasso do outro, o seu valor. No fundo, no fundo a pessoa enciumada se acha o mosquito do cocô do cavalo do bandido e faz de tudo para receber do outro um reconhecimento, que ela mesmo não se dá.
Assim sendo, depois de armar o seu barraco, o ciumento espera que o outro tome as providências, de preferência anulando-se, no sentido de aliviar o seu sofrimento. Caso prevaleça essa postura, em que saem vitoriosos o egoísmo e o medo, o amor sai perdendo. Sai perdendo porque o amor só é belo quando é livre. Quando o engaiolamos, ele só tende a murchar e a entristecer.
Tolhendo a liberdade do nosso parceiro, como teremos certeza de que ele está conosco por vontade própria?
Nesse caso o ciúme só faz aumentar a dúvida; e a dúvida, por sua vez, só faz aumentar o ciúme. Ficamos atolados num círculo vicioso.
Uma outra consequência dessa invasão do espaço de liberdade que o ciúme provoca é que começamos a sentir uma inevitável e, muitas vezes, inconfessável, rejeição e raiva do parceiro ciumento. Queremos ficar livre da sua presença sufocante. A continuar assim, a morte do amor é inevitável. Necessariamente, isso não significa o rompimento do vínculo, pois a relação poderá continuar sendo mantida, por medo das consequências econômicas e sociais de uma separação ou por estar engessada a certas crenças familiares ou religiosas. O vínculo permanece, mas sem amor verdadeiro…sem vida. Sepulcros caiados, como diz a expressão bíblica.
Como veremos, não há nada de errado em sentir ciúmes. Aliás, desconheço alguém que não o experimente, inclusive eu, mesmo que de vez em quando. O problema é quando nos posicionamos de uma forma errada quando ele se manifesta.
Felizmente podemos aprender a encarar o ciúme de uma forma mais edificante e colocá-lo a favor do nosso relacionamento. Como aponta a música “Estranho Amor”, do Caetano Veloso, que diz assim:
“… deixe o ciúme chegar
deixe o ciúme passar
e sigamos juntos”.